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6/13/2007

COMO DEVERÁS AGIR.




Não te preocuparás em que tua voz não tenha a força das ondas encapeladas, nem procurarás que ela tenha o

bramir forte das cachoeiras.

Esmerar-te-ás, isso sim, para que ela tenha a transparência da gota de orvalho, a persistência e a fidelidade das gotas de chuva, o gosto bom e límpido dos sorvos na cava da

mão à fonte para matar a sede.

Não importa que tua voz seja alta, que tenha o rugir do trovão; o que deve ser forte são os teus argumentos, capazes de convencer ainda que os cicies ou até os murmures,

para não dizer daqueles que falem por si mesmos,

ainda que te mantenhas em silêncio.

Não, tu não farás que tuas mãos tenham a força das manoplas, a violência dos punhos cercados, a crispação

dos dedos que empunham um chicote ou que se

servem do fio da navalha.

Pelo contrário;

darás, à tua mão, não a força bruta, mas

a firmeza do amparo;

usa-la-ás, não como se fosse um martelo,

mas como se fosse, porque deve sê-lo, a propiciadora

generosa que tanto acaricia a terra para nela lançar

a semente, como a que afaga a pétala para render

tributo à formosura da corola.

Não, meu irmão, tu não pregarás o infinito como

se tu mesmo fosses a verdade, como se a grandeza

residisse em ti mesmo.

Falarás do firmamento com a humildade de quem

sabe que está com os pés na terra, mas pode

olhar confiante para as estrelas;

falarás suavemente, com a confiança de saber

que és lembrado justamente porque és pequeno, e

não que o infinito seja infinito porque o dizes,

pois estás muito longe de ser, em ti, prova do

sem-fim e da serenidade.

Pregarás a verdade, é tua obrigação, pois

não pode espalhar o reino da mentira e da

mistificação entre teus semelhantes.

Lembra-te, porém, de que a verdade não

é verdade porque dizes que ela o é.

Tu podes enganar-te e dizer que é vero o que

é falso, ainda que não tenhas intenção de mistificar.

A verdade é verdade em si mesma.

O primeiro argumento que tens para defendê-la

é que ela te haja convencido ou que, contra ela,

não encontres argumentos razoáveis e fidedignos.

Se evitares a mentira que conheces, estarás

trabalhando muito mais pela verdade do que buscando

mil argumentos para defender ou justificar esta.

Tal como o tamanho de um discurso não dá a dimensão

exata de seu valor ou mérito, igualmente a erudição

não é, em si, prova ou sinal de sabedoria.

Há citações eloquentes que dizem muito menos

que a palavra simples dos que estão falando

sobre aquilo que em sua experiência ou sua

observação lhes transmite ou ensina.

Não te preocupes, assim, em doirar o que falas,

como se fosse uma pílula: melhor farias se soubesses

usar o que conheces: aí estaria tua verdadeira sabedoria.

Acredita com firmeza, mas não sejas ingênuo.

Os crédulos não são crentes numa verdade firme,

mas tolos que se deixam levar por qualquer mistificação

ou mentira grossa, reflete dez vezes antes de falar;

reflete cem vezes antes de escrever;

reflete mil vezes antes de publicar o que escreveste.

Odeia o ódio; irás, assim, muito mais longe,

do que se simplesmente amares o amor.

Teu momento vale uma hora;

vale um ano;

vale todo o tempo, porque é fração de eternidade

e cada divisão desta é eterna em si.



Rhámar l'Húmistan



Tradução de José Wanderley Dias

Autor e tradutor, em uma esfera maior.

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